Sinto muito, erramos.
Eu sei que a sua intenção era boa, mas não soubemos
aproveitar.
Eram recursos demais, poderes demais.
Desculpe, entendemos tudo errado.
Cada um de nós imagina você de um jeito.
Cada um de nós compreende o que você ensinou de uma
maneira.
O que importa mesmo é que do amor, que deveríamos ter
aprendido e que supostamente deveria nos unir, bem, quase nada nos une.
A religião nos separa, nos divide, nos faz odiarmos, a
gente faz guerras por causa dela, mata pessoas, destrói lugares, famílias, não
importa. Em nome da fé matamos mais do que por outras razões. Desculpe.
A gente quer poder também, mais do que precisa. Queremos
nos sobrepor sobre o outro. Empatia, não temos, eu sei que você ensinou sobre
isso, mas perdão, não aprendemos. Para ter poder incitamos o ódio, e por falar
em ódio, este sim é um sentimento que nos une. Sempre odiamos algo, ou alguém, temos
essa necessidade, entende? Você falou sobre amor e respeito, e nós ouvimos
ódio. Pensou diferente da gente, odiamos. Tem um discurso diferente, odiamos.
Nós nos tornamos especialistas em odiar, e em agir motivados por esse ódio.
Hoje por aqui os pais matam os filhos por diferenças ideológicas,
e se matam depois.
Desculpe, nós definitivamente não aprendemos que somos
todos iguais. As mulheres não são, nem os negros, nem os gays, nem os
deficientes. E não o digo apenas em questão a oportunidades, que
definitivamente não são as mesmas, me refiro a sentir-se igual, a não ser
violentado na rua, a não receber ameaças na internet.
Sinto muito mas não sabemos, de um modo geral educar as
nossas crianças. Temos um discurso educacional e de formação com um texto
pronto sobre desigualdade. Sim, os ensinamos primeiro sobre o diferente ser
ruim, e não o contrário.
Desculpe mas estamos destruindo tudo. O planeta, as
águas. A gente se importa muito pouco, ou quase nada, com quem virá em seguida.
E por não nos preocuparmos, tanto faz como encontrarão as coisas por aqui.
As lições de fidelidade e lealdade, sinto muito, não
aprendemos direito. Na verdade a gente se importa muito pouco com o outro, com
o que ele sente e como reage.
Hoje em dia falamos muito sobre liberdade. A de
expressão, a sexual, a financeira, a gente só esquece que as barreiras que nos
prendem são postas por nós mesmos.
Pouca gente se apaixona, desculpa. Se tem alguém por quem
somos definitivamente apaixonados esse alguém somos nós mesmos. Nos amamos. E
em nome desse amor passamos por cima dos outros, mentimos, enganamos, e fazemos
tudo, tudo o que for preciso.
E não adianta opinar, formular, dissertar. A nossa opinião
será esquecida em dois cliques, porque se tem algo veloz hoje em dia é a informação,
quase não damos conta de memorizar nada, de demorar em nada, de nos aprofundar
em nada. Somos soterrados a todo instante por informações e imagens e
mensagens, desculpe por isso.
Continuam a valer os clichês: valorizamos quando
perdemos, compreendemos quando não há tempo.
A gente não entende mesmo de amor, e sim, eu sinto muito.
A gente prefere dizer eu te amo frente a uma lápide à uma janela. Prefere
visitar no hospital à uma xícara de café em casa, na sala. Prefere chorar sobre
as fotos antigas à um ombro.
Desculpe, mas se você olhar bem, aqui não tem sido um bom
lugar. É lindo, eu sei, mas tem sido difícil demais buscar equilíbrio diante de
tanto caos.
Mas nem tudo está perdido, tem gente muito boa,
solidaria, que ama você e demonstra, tem gente que não faz distinção das
Marias, Joanas, Anas, nem as que nasceram assim, nem das que se tornaram. Tem
gente que respeita o diferente, que exercita a tolerância. Tem gente que faz
isso tudo valer à pena. E gente que não desiste. E enquanto houver quem não
desista estaremos aqui, na esperança de que um dia a gente aprenda.